
RENASCIMENTO DO POETA
Renasço neste dia ao céu poento, caduco e inquieto.
Não como fênix desprezando as cinzas, mas como o broto
Rompendo a superfície neutra da carapaça germinal.
Amanheço envolto por alarmes atônitos
Braços Armados; espadas sem mãos tintilam espasmos, cochichos,
Trovão ensurdecido pelo próprio estrondo.
Não… Não é o mesmo poeta que renasce.
Do limbo ao despertar perdeu-se o que era inútil.
Arvoro-me por vielas sensuais, incompletas, sinalizadas pela aurora em fuga.
Sem desperdício assumo a melodia que me cabe.
No vácuo sigo sem plateia; desço na estação; caminho até a ponte.
Repouso a vista sobre o velho monge.
Barrancos de arreia inertes. Vegetação intrusa – nuvens maciças no leito fértil.
Derramo meu canto sem avançar os trilhos.
O maxilar cochilando sobre o joelho curvo.
Atiro uma pedra: círculos concêntricos se dispersam sobre a água em ebulição.
Eis enfim um som, mesmo que sem eco.
Submerso, indeciso. Mas não se perde.
Sem aviso – despido de veneração ou espera – escorre até a margem próxima.
Sem pressa acalenta o espanto súbito e, passo a passo, contorna a fios de aço a anatomia definitiva da novel criatura.
Lucas Rodrigues.
1 comentário
Belíssima poesia amigo Lucas! Cheia de possiveis interpretações e mensagens, como deve ser uma boa poesia.
Talentos como o seu jamais devem ficar inertes e, como você mesmo diz na poesia (“Sem desperdício assumo a melodia que me cabe. No vácuo sigo sem plateia; desço na estação; caminho até a ponte.” Linhas 11 e 12), devemos assumir nossa missão, na medida do possível, para contribuir com o desenvolvimento (em todos os aspectos) da nossa sociedade, afinal, foi ela que nos deu a oportunidade de sermos tal como somos. Do contrário, se ficarmos inertes, como as margens do rio (“Barrancos de areia inertes. Vegetação intrusa – nuvens maciças no leito fértil”, Linha 13), que apenas veem as águas correrem em seu leito, não terá sentido nossa passagem nesse mundo. Vivendo dessa forma certamente teremos uma vida mais tranquila, por caminhos mais fáceis e curtos, porém ao morrermos, em pouco tempo, seremos apagados da memória, pois em vida não fomos capazes de criar uma história digna de lembranças e glórias.
A glória individual é passageira, já a glória coletiva é eterna.